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O Abikú |
Olá meus irmãos, hoje falaremos um pouco de um assunto bastante polêmico para muitos: O Àbikú, e desde já peço licença aos meus irmãos candomblecistas para redigir este Post, pois como sempre digo que as nações do Candomblé não são a minha área de especialidade, e o conhecimento que por mim é levado a vocês através deste texto, é fruto do aprendizado que tive ao presenciar as conversas do meu finado e sempre amado Zelador de Santo Edinato de Ogum com Babalorixás destas nações que eram muito amigos, e vendo os mesmo conversarem, e como eu tinha (e tenho ainda), o costume de fazer anotações sobre tudo o que eu aprendo fiz anotações há muito tempo sobre a conversa e juntei a pesquisas que tenho feito até hoje, e o resultado agora eu compartilho com vocês.
Quero de antemão deixar bastante claro que se caso haja algum tipo de erro nesta postagem, que ele seja considerado única e exclusivamente meu, por alguma falha que possa ter acontecido nas anotações ou na minha memória, ficando certo que nem mesmo meu finado zelador, ou seus diletos amigos tem alguma culpa nisso, então vamos a leitura!.
O Àbíkú
A
tradução literal é “Nascida para morrer”
(A bi ku) ou “O parimos e ele morreu” (A
bi o ku), designando crianças ou jovens que morrem antes de seus pais.
Há,
assim, dois tipos de Àbíkú:
1º. - Àbíkú – Omode:
Designando crianças.
2º.
Àbíkú – Agba: Referindo-se
a jovens ou adultos que morrem, via de regra, em momentos significativos de
suas vidas e sempre antes dos pais, apresentando nisso uma alteração da ordem
natural que socialmente é aceita e entendida como: “Aqueles que chegaram ao Aiyê (mundo físico) primeiro voltam primeiro
ao Orún (mundo espiritual)”.
Nessa
questão, além da lógica natural, está presente a garantia da continuidade no Aiyê
e a certeza da lembrança e do culto ao ancestral que deixa descendentes que
recontarão sua história ao longo dos tempos, garantindo sua “sobrevivência” na
comunidade.
No Orún vive um grupo de crianças chamadas Emerê ou Elegbê e este grupo constitui o Egbé Orún Àbíkú, ou seja, “Sociedade das crianças que nascem para morrer”. Contam os mitos que a primeira vez que os Àbíkú vieram para a terra foi em Awaiye e constituíam um grupo de 280 (duzentos e oitenta), trazidos por Awaiye, chefe deles no Orún.
O Itãn
Na
encruzilhada que une o Orún ao Aiyê, chamada em Iorubá de Ikorita meeta, todos pararam e vários
pactos foram feitos, definindo o momento particular do retorno de cada um ao Orún. Alguns voltariam quando vissem
pela primeira vez o rosto da mãe, outros quando casasse, um terceiro grupo
voltaria quando completasse determinado tempo de vida, um quarto grupo voltaria
quando tivessem o primeiro filho, e assim por diante. E o carinho dos pais, o
amor que recebessem ou os presentes não seriam capazes de retê-los no Aiyê. Alguns assumiram o compromisso de
que nem nasceriam.
Esse pacto deveria ser cumprido e os seus companheiros no Orún manter-se-iam presentes na sua vida, interagindo no seu dia a dia, para que não o esquecessem, e retornassem ao Orún tão logo o momento pactuado ocorresse.
A Ciência em prol da tradição
Mais
como chega a ocorrer o nascimento ou a manifestação de um Àbíkú em uma gravidez?
O
Iorubá acredita que a ação do Àbíkú ocorre por determinação do
destino da mãe, ou por força de magia/feitiçaria, ou por condições acidentais.
Nas minhas pesquisas para redigir este Post, me deparei com o livro do Prof.
Sikiru Salami (Mestre e Doutor em Ciências Sociais da USP-SP) e a Dra. Ronilda Iyakemi
Ribeiro (Doutora em Psicologia e Antropologia da África USP-SP), que na sua
monografia “Ayedungbe: A terra é doce
para nela se viver – rito na luta contra a morte de Àbíkú” definem essas condições
acidentais como “Aquisição inadvertida de
um Àbíkú por uma mulher grávida que
não tenha tomado os necessários cuidados para evitar isso”.
Existe
a crença de que uma mulher grávida, ao passar por determinados locais em que os
Àbíkú se estabelecem se não estiver devidamente protegida, e pode ver-se
invadida por este “espírito” e
tornar-se sujeita à gravidez de um Àbíkú. Por isso cuidados especiais
são tomados pelas mulheres tão logo tenham consciência do estado de gravidez.
Não
é raro que mulheres grávidas carreguem junto a barriga um “Otá”, devidamente
preparado, para evitar essa “invasão” por parte de um Elegbe.
Sacrifícios, oferendas e rezas são feitas também com o objetivo de evitar que uma mulher tenha filhos Àbíkú ou que, grávida, venha a ser “invadida” por um deles.
O que dizem os Odús
Deixando de lado condições acidentais ou efeito de magia/feitiçaria, as tradições e ensinamentos dos nossos mais velhos dizem que a ocorrência de Àbíkú numa mãe invariavelmente repete uma história familiar, que podemos reconhecer procurando os seus antecedentes, ou seja, podemos procurar nos antecedentes familiares da mãe para constatar, invariavelmente, que este Àbíkú vem se fazendo presente na família, geração após geração, em linha direta ou não.
Segundo
o que aprendi, é que se pode afirmar com grande precisão que alguns Odús de nascimento predispõem a
ocorrência de Elegbe, assim, segundo
alguns sacerdotes, temos que mulheres regidas pelo Odú Ogundabede (Ogunda + Ogbe) são naturalmente predispostas a gerarem
filhos Àbíkú e, identificadas, quando ainda não são mães, certas
oferendas são realizadas e alimentos são-lhes dados para prevenir a ocorrência,
Ebó igualmente é feito nas situações
em que já geraram filhos ou planejam gerar – um preá é colocado acima da porta
de entrada da casa e um peixe acima da porta de trás, para proteger os
moradores da visita dos Elegbe que
ali vêm em busca de seus companheiros, neste caso, deixam de ter acesso ao
interior da casa e levarão, no lugar da pessoa que vieram buscar, o preá e o
peixe.
Um
Orin Egbe, cantiga dedicada a Aragbo
ou Ere Igbo, Orixá protetor das crianças Àbíkú,
fala-nos desse Ebó.
O que fazer e como cuidar
Entendemos,
assim, que Egbe é cultuado e louvado
com a finalidade de defender as crianças da morte prematura e oferendas lhe são
feitas para que “desistam” de levar os Àbíkú de volta para o Orún, sendo um de seus objetivos a
questão da manutenção dessas crianças no Aiyé.
Voltando
ao campo antropológico e das Ciências, segundo o Prof. Sikiru Salami e a Dra. Ronilda
Iyakemi Ribeiro, na obra já citada, “… Estabelece-se
assim um jogo de forças entre Aragbo
e a comunidade de Àbíkú que deseja
levar seus membros do Aiyé, mundo
físico, para o Orún, mundo dos
mortos, mundo espiritual”.
Cultos
e oferendas são realizados tanto para que a comunidade de Àbíkú abra mão de
levá-los de volta, como para que Ere igbo
os proteja de serem reconduzidos à terra espiritual.
A tradição nos fala que todas as pessoas nascidas dentro do Odú Ogundabede, homens e mulheres, devem cultuar Egbe. Entende-se também que quem o cultua evoca as suas bênçãos em benefício das crianças do núcleo familiar, aliás, o culto de Egbe e suas festas trazem muita semelhança com as festas e o culto que se fazem para “Cosme e Damião” e que são, muitas vezes, confundidas com o culto do Òrìsà Ibeji. Este Òrìsà e Egbe (ou Aragbo) são de distintas naturezas, justificam abordagens e tratamentos diferenciados, têm formas particulares de serem louvados, são cultuados por diferentes razões e necessidades, e os seus cultos não podem ser confundidos sob pena de incorrermos em erro de fundamento, segundo os mais velhos da religião.
Por
último, mas não menos importantes dois aspectos são importantes de serem
nomeados: o primeiro, diz respeito ao que podemos chamar de comportamento
peculiar da criança Àbíkú, que são, certamente, crianças que se distinguem por este
aspecto, e segundo, a resistência, na nossa cultura, que os pais têm em aceitar
o fato de terem um filho Àbíkú e a dificuldade consequente em
lidar com esta criança e todas as necessidades decorrentes da luta pela sua
permanência no Aiyé.
Cabe aí um importante papel para o sacerdote que pode ajudá-los a compreender a questão, dar-lhes orientação e acompanhamento durante todo o processo.
O têrmo Abikú não se pontua apenas a aqueles que nascem para morrer, como determina o conceito Iorubá, pois sendo assim todos nós seríamos Abikús. Meu entendimento com esse ensinamento para exemplificar, é que Abikú tem qualidade, ou seja, existem vários tipos de Abikú e formas de atuação e agregação, numa mesma concepção.
Segundo
o conceito dos sacerdotes Iorubás, pode-se cuidar de uma criança Abikú,
fazendo-a conviver normalmente entre os seus, fazendo oferendas, Ébós, tratamento do Orí (cabeça), que são capazes de reter no mundo o Abikú
e de lhe fazer esquecer sua promessa de volta, rompendo assim o ciclo de idas e
vindas constantes entre o Orun e o Aiye, fazendo pactos também.
Quando
o zelador observa através do jogo a presença de Abikú, o tratamento
começa no ventre da mãe com as obrigações necessárias e Ébós, através de Oxum, Orí,
Exú, Egungun, Oxalá.
E
chegamos ao final de mais um Post meus irmãos, espero que tenham gostado, quero
ressaltar novamente que o que foi escrito neste texto nasceu do assunto ouvido
em conversas do meu Zelador com seus amigos em minha mocidade, e que a
curiosidade, que é a mãe do conhecimento, me levou através dos anos a pesquisar
sobre o assunto, tendo minhas próprias conversas com Babalorixas do Candomblé,
que muito agregaram ao meu conhecimento me dando informações e me indicando
literaturas sobre o assunto, pois como eu disse antes, as nações do candomblé e
seus ritos não é algo que eu domino, pois sou Umbandista, mas é algo que vale a
pena se conhecer por suas histórias e tradições culturais, e importância religiosa,
então caso tenha algum erro, ele é inteiramente meu, e convido aos amigos que
tenham mais conhecimentos a deixar um comentário me informando aonde eu errei
assim me dará a oportunidade de concertar.
Um
grande abraço a todos, e desejo a vocês um grande axé!
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